A Ilha das Flores
O Nome Atual
Em princípios do século XIX, a Ilha das Flores pertencia a Delfina Felicidade do Nascimento Flores e seria denominada como Marim. É possível que o seu nome atual decorra dessa proprietária, pois o local deveria ser conhecido como a “ilha da D. Flores”. Já em meados dos anos de 1840 as ilhas das Flores, Ananás e Engenho aparecem com esses nomes na Carta de Lamare (1847) o que colabora com a ideia de que com o passar do tempo prevaleceu a atual nomenclatura Ilha das Flores. Em 1834, a ilha passou ao patrimônio da Província do Rio de Janeiro, tendo sido arrematada em 17 de agosto, em “praça de Juízo de Feitos”, por Maria do Leo Antunes.
O Senador na Ilha
Em 10 de junho de 1857, Francisco José de Brito, procurador de Maria Antunes, concretizou a venda da Ilha das Flores para o Conselheiro e Senador pela província de Goiás, José Ignácio Silveira da Motta, por 4 contos e 700 mil reis.
Ao adquirir a Ilha das Flores, a Mexingueira e Ananás essas últimas em 1862, Silveira da Mota as tornou um lugar de experimentos arrojados. A Comissão do Imperial Instituto Fluminense de Agricultura, responsável pela avaliação das experiências psicultoras que ali se realizavam - informava que o “o terreno da ilha está, em grande parte, inculto; a porção, porém, aproveitada em jardim, horta, pomares e roças mostra a feracidade natural, pelo desenvolvimento e viço do arvoredo e plantações”
Desenvolvia-se ali a criação intensiva de peixes em seis tanques que comportavam até doze mil exemplares. A referida Comissão do Ministério da Agricultura, tendo em vista a crescente demanda de alimentos, gerada pelo crescimento populacional das duas capitais – a Corte e a cidade de Niterói, então capital da província do Rio de Janeiro - avaliava positivamente a experiência que ali se desenvolvia.
A Criação da Hospedaria de Imigrantes
O governo brasileiro adotou uma série de medidas para promover a imigração. No ano 1876, por exemplo, foi criada a Inspetoria Geral de Terras e Colonização, órgão subordinado ao Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, responsável pela fiscalização e direção de todos os serviços atinentes a imigração e a colonização.
Senador José Ignácio Silveira da Motta, foto de Militão Augusto de Azevedo.
Hospedaria de Imigrantes da Ilha das Flores. Ao centro, Pavilhão Principal. À direita, depósito de bagagens. À esquerda, lavanderia. Fonte: FERREIRA, Felix. A pronvíncia do Rio de Janeiro. Notícias para emigrantes. Rio de Janeiro: Imprensa a vapor H. Lombaerts & Comp., 1888. p.2.
Desse modo, entre outras atribuições, coube a referida Inspetoria assegurar ao imigrante hospedagem e transporte gratuito até o lugar que preferisse, dando-lhe plena e completa liberdade de se estabelecer na colônia que escolhesse para sua residência, bem como a garantia de acesso a terra, sementes e instrumentos de trabalho.
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Após a visita da Comissão do Imperial Instituto Fluminense de Agricultura, iniciaram-se as negociações entre o senador e o governo do Império para a venda da ilha. Em 14 de novembro de 1878, Silveira da Mota ofereceu uma festa ao ministério do Visconde de Sinimbu onde foi acertada a venda da ilha por 500 contos de réis.
A conclusão da transação ocorreu em 1883 quando, em 16 de janeiro, compareceram, na Diretoria Geral do Contencioso do Tesouro Nacional, o Senador Silveira da Motta e o Conselheiro João Cardoso de Menezes e Souza, procurador fiscal do Tesouro, concretizando a venda do arquipélago por 170 contos de reis. A partir de então deu-se início a construção da Hospedaria de Imigrantes da Ilha das Flores.
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Ainda que houvessem incentivos para estrangeiros que se estabelecem no Brasil, o movimento de entrada de imigrantes não atendia as expectativas do governo imperial durante a década de 1870. A principal razão para o Brasil não obter o resultado desejado estava na insalubridade da capital do Império, noticiada constantemente tanto pela imprensa nacional quanto pela estrangeira.
As condições sanitárias do Rio de Janeiro do século XIX causaram uma série de embaraços a atividade comercial e na necessidade de se encontrar outras formas de trabalho. Em 1881, sob o argumento de que em épocas de epidemia a recepção de imigrantes na cidade do Rio de Janeiro exigia “conveniências da saúde pública”, o governo imperial autorizou a construção de um edifício adequado à recepção de imigrantes, em condições de comportar o movimento anual de 30 mil indivíduos.
Foi com este objetivo que a Inspetoria Geral de Terras e Colonização adquiriu a Ilha das Flores, estabelecendo ali uma hospedaria adequada para receber os imigrantes recém-chegados, impedindo-os de manter contato com a população da Corte e, principalmente, com as suas constantes epidemias.
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Desembarque de imigrantes na Hospedaria. Ilha das Flores. Primeira metade do século XX. Coleção Leopoldino Brasil. Acervo Centro de Memória da Ilha das Flores/UERJ
Em 01 de março de 1883, o ministro da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, Afonso Augusto Moreira Penna, ordenou que depois de desembarcar no Porto do Rio de Janeiro, todos os passageiros vindos de portos estrangeiros em 3ª classe deveriam ser imediatamente transportados, com as suas respectivas bagagens, até a Ilha das Flores, onde seriam acolhidos gratuitamente até o máximo de oito dias.
Após o desembarque na Ilha, os imigrantes eram imediatamente alojados nos dormitórios. Posteriormente, todos eram encaminhados para o Escritório da Diretoria, onde o escrivão realizava o registro dos imigrantes em livros, nos quais se anotavam a procedência, o nome do navio, a data de entrada, o número de ordem, o nome, a idade, o estado civil, a nacionalidade e a profissão de cada um.
Após o registro, os imigrantes passavam pelo consultório médico a fim de verificar o seu estado de saúde, prevenindo assim a entrada de doenças infectocontagiosas. Durante um grande período os alojamentos da hospedaria foram divididos de acordo com o gênero e o estado civil dos imigrantes. Desse modo, havia dormitórios para os jovens solteiros, os homens casados, as moças solteiras e as mulheres casadas com filhos pequenos. Devidamente acomodados, os imigrantes passavam por mais um momento de dificuldades, a adaptação à comida brasileira. A cozinha e o refeitório estavam instalados em um edifício contiguo a hospedaria.
A Ilha das Flores apresentava uma estrutura bem moderna para a época. Além de sistema de captação da água da chuva, havia tanques biológicos responsáveis pelo tratamento de dejetos a fim de que estes não poluíssem a Baía da Guanabara. No ano de 1907, diversos edifícios foram demolidos, pois sua estrutura de madeira estava em precário estado de conservação. Para substituí-los foram construídos na ala norte novos pavilhões, nas melhores condições de higiene e conforto. Os novos pavilhões possuíam 124m de comprimento por 12m de largura, circundados por varandas laterais. Internamente eram divididos em grandes quartos, mobilhados com beliches de ferro. Atualmente, esses edifícios encontram-se preservados e fazem parte do Circuito a Céu Aberto.